sábado, 26 de maio de 2012

O caminho até à final de Viena * Meia-Final

Continuamos a recordar a caminhada do FC Porto até Viena que culminou com a conquista da Taça dos Campeões Europeus em 27 de Maio de 1987.

Hoje é a vez de recordarmos o jogos das meias-finais disputado diante do Dinamo de Kiev, equipa na altura considerada a melhor da Europa.

Para narrar esta epopeia, iremos transcrever um grande trabalho de 2007, publicado por "guardabel" no "o Pobo do Norte: o pobo mais forte", um blog referência da bluegosfera.


FC Porto 2 - Dinamo de Kiev 1 * 1ª. Mão

O FC Porto venceu o Dínamo de Kiev, por 2-1, na primeira mão da meia-final da Taça dos Campeões Europeus de 1987. Face ao poderio dos campeões soviéticos, uma vitória é sempre facto a registar, mas o golo de Yakovenko destruiu muitas esperanças na passagem à final de Viena. Daqui a 15 dias saber-se-á se o iremos conseguir...


Ficha do jogo:

Estádio das Antas, 08/04/1987 
Assistência: Cerca de 80.000 pessoas

Árbitro: Jan Keizer (Holanda)

FC Porto: Mlynarczyck; João Pinto, Lima Pereira, Celso e Eduardo Luís; Jaime Magalhães, André, Sousa e Vermelhinho; Gomes e Futre.
Subs: Sousa e Jaime Magalhães por Juary e Madjer, respectivamente.
Suplentes não utilizados: Zé Beto, Inácio e Semedo.
Treinador: Artur Jorge

Dínamo de Kiev: Tchanov; Baltacha; Bal, Kuznetsov e Demianenko; Yakovenko, Zavarov, Mikhailitchenko e Rats; Belanov e Blokhine.
Subs: Blokhine e Belanov por Morozov e Yevseyev:
Suplentes não utilizados: Bessonov, Gorili e Mikhailov
Treinador: Valeri Lobanosvski

Amarelos: Bal, Tchanov e Futre. Duplo amarelo: Bal



Os golos, descritos pelos jornais desportivos:

Record: 1-0 aos 49 mins por Futre, após excelente jogada do nº 10 portista pelo lado direito e que, depois de se ter desembaraçado de vários adversários, acabou por fazer um centro-remate com a bola a tocar (ainda) num defensor do Dínamo antes de entrar na baliza (O jornal O Jogo considera o golo como sendo de Kuznetzov, na própria baliza).

A Bola: 1-0: Grande jogada de Paulo Futre, na direita, furando por entre Demianenko e um outro jogador soviético a bola é tocada por Kuznetzov, mas o ressalto fá-la ir para o portista. Por alto, é batida para a baliza dando-nos até a ideia de que fora um soviético. Entra por alto.

Record: 2-0, aos 56 mins, por André, na transformação de uma grande penalidade a punir uma mão de Kuznetzov após a marcação de um pontapé de canto também por Futre.

A Bola: 2-0: Futre foi ao lado direito marcar um canto, a bola partiu por alto e Kuznetzov, pertyurbado com a presença de um portista, meteu mão â bola. Penalty que André transformou.

Record: 2-1 aos 74 mins, por Yakovenko, numa magnífica antecipação de cabeça a uma bola que estava ao alcance de Celso.

A Bola: 2-1: Cruzamento da esquerda sobre a grande-área do FC Porto, por alto. Celso tem a bola à frente, hesita, espera que ela venha ao seu encontro. Não vai. Yakovenko antecipa-se-lhe e, de cabeça, desvia a bola, rasteira, para entrar junto ao poste esquerdo.

Dinamo de Kiev 1 - FC Porto 2 * 2ª. Mão

A 17 de Abril, o FC Porto bate o Vitória de Guimarães por 5-0, no Estádio das Antas, em partida dos quartos-de-final da Taça de Portugal. Os golos são apontados por Madjer (2), Lima Pereira, Futre e Gomes. Esta vitória assume particular significado porque foi obtida contra um clube que tinha empatado 2-2 nas Antas para o campeonato e se assumia como candidato ao título. E depois, este seria o último jogo antes da ida a Kiev. As crónicas da altura falam no melhor jogo da época por parte do FC Porto.

O jornal A Bola intitula a 20/04: "É OBRIGATÓRIO REEDITAR EM KIEV O ESPECTÁCULO "ESPLENDOR NAS ANTAS".

A nível interno, os jornais dão conta da rescisão do brasileiro Elói, um jogador de enormíssima qualidade que nunca se conseguiu impor no onze titular.

Os convocados para Kiev são, entretanto, conhecidos: Mlynarczyk, Zé Beto, João Pinto Lima Pereira, Celso, Eduardo Luís, Festas, Jaime Magalhães, André, Vermelhinho, Frasco, Quim, Juary, Madjer, Gomes, Futre e Paulo Ricardo. Saem Semedo e Inácio por opção.
Da União Soviética chegam notícias de que o Dínamo perdeu o último jogo para o campeonato, mas poupou muitos titulares para o jogo da Taça dos Campeões. Bal não jogará contra nós por ter sido expulso no jogo da primeira mão.

O FC Porto chega a Kiev com uma temperatura surpreendentemente agradável para o local em questão.

O Jogo de 21/04 apresenta os seguintes títulos: "FC Porto não treme nem de frio" – "Sete graus à chegada a Kiev"; "Temperatura amena faz subir a confiança".

A confiança é de facto grande, apesar de se saber que a lotação de 100 mil lugares está há uma semana esgotada. De Portugal, prevê-se que três aviões levem cerca de 500 adeptos portistas até Kiev.
A comitiva portista leva mais 600 kg de bagagem por causa da alimentação, uma vez que o desastre de Chernobyl motiva ainda preocupações na Europa.
O médico do FC Porto, Dr. Domingos Gomes, explica: "Tivemos obviamente de nos rodear dos maiores cuidados com esta deslocação, especialmente em matéria de alimentação." No que diz respeito a lesionados, o quadro clínico está desanuviado, excepção feita a Gomes, que partiu um dente no jogo da Taça, mas é recuperável.

Declarações de Octávio: "Concentração e rigor são necessários"; "Temos uma grande equipa europeia, de nível mundial, que se tem vindo a impor à custa de muito trabalho, de muita dedicação, no prosseguimento de um projecto que vem tomando forma de há alguns anos a esta parte."

Declarações de Futre: "...acho que teremos de marcar golos para chegar à final. E não me admirava nada que o FC Porto saísse vitorioso da União Soviética."; "Acho que a arma forte deles é o contra-ataque. Tinha mais medo do jogo das Antas do que do jogo de Kiev, porque em Kiev teremos de jogar mais fechados e o Dínamo não terá oportunidade de fazer funcionar esse terrível contra-ataque."

A 20/04, A Bola publica a seguinte manchete: "FC Port...ugal – Vamos atravessar a antecâmara de Viena"

Nas páginas interiores, Vítor Santos, escreve: "Ao FC Porto pede-se a última proeza, mas tem de se reconhecer que já fez muitas!" – "Kiev é a antecâmara de Viena e não haverá milagre nenhum se os campeões nacionais conseguirem atravessá-la".

O Record de 21/04, véspera do jogo praticamente ignora o jogo, preferindo dar destaque ao sorteio das meias-finais da Taça de Portugal. No cantinho inferior esquerdo, a notícia sobre o FC Porto é a de que... "Zé Beto deixa as Antas" na próxima época.

Nas páginas interiores do Record, revela-se que a eliminação do Dínamo poderá dar prémio de 1000 contos e Juary promete "marcar um golo à União Soviética".

O JOGO de 22/04, dia do confronto, intitula: "Em frente dragões!" E no interior, pede-se "Um coro afinado na terceira catedral". Só como um coro afinado, poderá o FCP chegar à final de Viena.

O enviado-especial de O Jogo, Faria de Morais, escreve que "Os kievitas andam apreensivos com o aspecto "emotivo" do futebol português, que nunca se sabe para que lado se virará", se para o positivo (empolgamento) ou negativo (indisciplina táctica e desorientação)".

Artur Jorge joga "à defesa", não relevando o 11 que entrará em campo. E acrescenta: "Uma final não cai do céu – tem de ser procurada"; "Defrontar o Dínamo é um exercício extremanente cuidadoso e rigoroso. Actuaremos em Kiev com um espírito intervencionista: as finais europeias não caem do céu, provocam-se. A atitude passiva terá de ceder lugar ao espírito ganhador."

O presidente Pinto da Costa afirma: "...creio que o FC Porto está a atravessar um bom momento, as lesões vão diminuindo e, por isso, penso que vamos acabar a época da melhor maneira. Por isso, espero que, frente ao Dínamo de Kiev, a equipa renda o máximo, em concentração, em personalidade e em determinação. Se assim for, estou convencido de que conseguiremos o nosso grande objectivo."

Lobanovsky diz-se "optimista" porque "nada se consegue fazer sem optimismo". "O jogo será "extremamente difícil para nós mas também não será fácil para o FC Porto", elogiando Gomes, Futre e Juary, "muito engenhosos, capazes de por a cabeça em água a qualquer defesa."

O relvado do estádio de Kiev motiva algumas preocupações: "Tapete do estádio central fica aquém da sua dimensão" – "carecadas não favorecem os esquemas portugueses"

Estádio da República da Ucrânia, em Kiev, 22/04/1987
Assistência: Cerca de 100.000 pessoas
Tempo seco e fresco. Relvado em mau estado e irregular

Árbitro: Ronald Bridges (Gales)

Dínamo de Kiev: Tchanov; Baltacha, Bessonov, Kuznetsov e Demianenko; Yakovenko, Zavarov, Mikhailitchenko e Rats; Belanov e Blokhine.
Subs: Baltacha e Belanov por Gorily e Evtuchenko.
Suplentes não utilizados: Morozov, Yevseyev e Mikhailov.
Treinador: Valeri Lobanosvski

FC Porto: Mlynarczyck; João Pinto, Lima Pereira, Celso e Eduardo Luís; Jaime Magalhães, André, Quim; Madjer, Gomes e Futre.
Subs: Madjer e Futre por Frasco e Juary, respectivamente.
Suplentes não utilizados: Zé Beto, Vermelhinho e Paulo Ricardo
Treinador: Artur Jorge

Golos:
Celso (4 mins.)
A Bola: "A bola tabelou num jogador soviético da barreira, formada à entrada da área, e entrou na baliza da Tchanov."
Record: "Celso, na marcação de um livre a castigar falta sobre Futre, como defesa brasileiro a arrancar um "tirão" que traiu o keeper soviético depois de tocar num defensor do Dínamo."

Gomes (10 mins.)
A Bola: "Canto marcado na esquerda por Madjer, com o pé esquerdo, o esférico sobrevoou a pequena-área do Dínamo, ninguém lhe tocou, e Gomes, perto do poste direito, marcou de cabeça."
Record: "Gomes, a seguir a um canto apontado do lado direito por Madjer, com a defesa soviética estática e abola a sobrar para a cabeça do capitão portista, muito lesto (e intencional) no seu cabeceamento."



Declarações dos intervenientes:

ARTUR JORGE: "Viemos aqui, a Kiev, com espírito positivo, com a intenção de fazer um golo. Estes jogadores merecem que se lhes tire o chapéu. Conseguimos um desafio brilhante, aliando o rigor táctico e a disciplina ao entusiasmo, à imaginação e elan."

LIMA PEREIRA: "Jogámos aqui como mais nenhuma equipa o faria. Com grande personalidade e categoria. Aos 35 anos, sinto-me tremendamente feliz. Estou na plenitude das minhas faculdades e atingi o sonho almejado: uma presença na final da Taça dos Campeões Europeus." (nota: Lima Pereira lesionar-se-ia gravemente... e falharia a presença em Viena.)

ANDRÉ: "Talvez não tenhamos feito um jogo bonito. Mas cumprimos o que estava estipulado tacticamente. Batemo-nos com inteligência e humildade."

PINTO DA COSTA: "Conseguimos o que mais nenhuma equipa do mundo conseguiria. Provámos a nossa categoria aos detractores. Mas hoje quero esquecê-los. Dedico esta vitória aos sócios que estão sempre com a equipa."; "Acabo de viver um momento inolvidável e que ficará para sempre gravado a letras de ouro na história do FCP. Há cinco anos, quando me candidatei, a palavra de ordem era: "SE QUERES UM FCP EUROPEU, VOTA EM PINTO DA COSTA." "Hoje, volvidos os tais cinco anos, conseguimos realmente fazer de um FCP descrente um FCP vitorioso, um clube com uma bem visível dinâmica de vitória. Por isso estou feliz, como julgo estarem felizes todos os portistas e, afinal, todos os portugueses."; "Este êxito do FCP é a melhor resposta àqueles que tanto o atacaram e não o respeitaram como deviam."

GOMES: "Esta foi a vitória da nossa classe e o Dínamo teve de se render a ela!"; "Pusemos o Kiev... KO, embora reconheça que não há campeões sem sorte".; "Quero dedicar esta vitória a todos os portugueses do futebol e a todos os portistas, já que defino este êxito como um triunfo de toda a nossa classe. Embora felizes, aqui e acolá, a verdade é que vencemos uma grande equipa, constituída por grandes senhores do fiutebol mundial."

LOBANOVSKI: não foi à conferência de imprensa.

APÓS O JOGO
A 23/04, o jornal O Jogo apresenta a seguinte manchete: "FC Porto é finalista" – "Só falta vencer o Bayern em Viena (27 de Maio)".

A crónica de Faria de Morais tem o seguinte título: "A personalidade e o saber de um batalhão sem medo". Escreve o jornalista sobre Artur Jorge: "E se muitos ainda duvidavam das qualidades do técnico portista, a forma como armou a equipa que se apresentou no maltratado relvado de Kiev, apostando claramente na discussão do jogo em todo o campo, mostra que o técnico portista sabe correr riscos, conhece até ao pormenor os jogadores que tem, é sem dúvida o grande obreiro desta inesquecível jornada de Kiev".
Na análise individual aos jogadores: "Mly, Celso, Gomes e Futre num todo à medida da Europa". Sobre o Dínamo: "Só Mikhailitchenko encontrou o para da mina" – "A defesa do Dínamo nunca viu Futre...".
Na reportagem sobre a festa na cidade, os títulos: "...E agora querem ser campeões europeus" – "Triunfo dos Dragões enlouqueceu a cidade"

A crónica de Aurélio Márcio intitula "A VELHA VIENA DOS ROMANCES À ESPERA DO CAMPEÃO PORTUGUÊS – O começo fulminante do FCP tornou fácil o que parecia difícil."
Excertos:
"O primeiro trunfo e o primeiro êxito do FC Porto terá estado, precisamente, em fazer o contrário daquilo que toda a gente (os técnicos e os jogadores ucranianos) esperavam. E o que eles esperavam era, muito naturalmente, muito logicamente, que o FCP aparecesse ali, não diremos transido de medo, mas receoso e prudente, de defesa muito cerrada, pelo menos até que passasse a primeira rajada do temporal soviético. Ao invés disso, um golo, dois golos! Fulminante! Quem pode resistir a um golpe deste tamanho?"
"Em conclusão: muito antes de o jogo acabar, já o destino do Dínamo e do FCP estavam irreversivelmente traçados. O silêncio gélido da multidão era a confissão antecipada da derrota; a falta de chama e de crença dos seus jogadores, um gesto de submissão inesperado, mas realista. O FC Porto vencia e convencia. O FC Porto estava na final. E agora, Viena! Vamos a Viena! Para ganhar o título de campeão europeu? Tem a palavra o FC Porto."
Na análise aos jogadores do FC Porto, pode ler-se: "FUTRE – UM TERRORISTA NO PAÍS DOS SOVIETES" – "Uma equipa bem orientada, feliz e com um plano de jogo bem executado".
Quanto ao Dínamo... "Uma defesa muito má e um notório desequilíbrio físico" – "Há qualquer coisa que falta às equipas soviéticas que não conseguem manter uma establidade atlética exigível com a alta competição."

Álvaro Braga faz reportagem na cidade do Porto: "O Porto é uma naçon, carago e, agora, venha lá a final de Viena" – "Das quatro às seis, tudo parou, voltando a parar às oito para recomeçar às dez e se estender pela madrugada e até Pedras Rubras, para receber os bravos do pelotão".
Realce ainda para um pequeno texto que dá conta do descontentamento portista em relação às arbitragens de Carlos Valente, a nível interno.

O título que o jornalista de A Bola escolhe não é inocente: "Queixas à moda do Porto: O árbitro Carlos Valente já dirigiu sete jogos do Benfica – lamento dos portistas que se sentem discriminados no sector da arbitragem."

A 24 de Abril, o jornal O Jogo publica a seguinte manchete:









O contraste é visível com o jornal Record do mesmo dia, cuja manchete é esta:












Realmente, era muito mais importante o não dos jogadores do Benfica à selecção do que o apuramento do FC Porto para a final da Taça dos Campeões... Enfim.

Carlos Arsénio, na sua crónica, intitula: "Soviéticos ko com táctica de Artur Jorge".
No interior, a festa portista é descrita com o seguinte título: "Arraial pintado de azul e branco em autêntica noitada de S. João".
Na análise aos jogadores, o destaque vai para o nosso guarda-redes: "Polaco Mlynarczyck foi o homem de Kiev" – "Num FC Porto, onde Gomes foi capitão, patrão e... marcador"

Capa de A Bola de 25 de Abril de 1987:










E agora… vemo-nos em VIENA!

2 comentários:

Penta disse...

um post excepcional!
parabéns!

abr@ço
Miguel | Tomo II

Dragus Invictus disse...

Bom dia Miguel,

Obrigado e grande abraço.

Paulo