terça-feira, 9 de outubro de 2012

FUTEBOL ENTRE 4 PAREDES

Na década de 80, acompanhava o FC PORTO pela rádio, através da voz de Gomes Amaro no Quadrante Norte. Nessa década eram poucos os jogos do meu clube que passavam na RTP. 
O meu pai ia sempre às Antas com os meus tios e primos, mas eu ficava em casa com as mulheres (mãe, tias e primas) a ouvir o relato e a gritar GOOOOOOOLO DO POOOORTOOOO. 
Eu era deficiente (e sou). Mentalidades. 
Que me lembre, em pequeno, fui uma vez ao estádio, num jogo contra o Beira Mar. Na década de 90, os relatos continuaram mas já dava o Porto mais vezes na TV e já ia às Antas com a família sempre que ganhávamos o campeonato. 
Lembro-me dum Tirsense, dum Salgueiros e outras tardes de festa. 
Quando surge a Sport TV, os meus pais não tinham dinheiro para pagar o canal, mas já tínhamos TV Cabo analógica e eu acompanhava os jogos codificados com fitas a correr psicadelicamente, fazendo parecer que estavam 44 jogadores em campo chutando uma bola quadrada. 
Quando descodificavam o canal nos últimos 15 minutinhos, era uma alegria. 
Em 1998, tive o meu primeiro PC com Windows, comprei uma placa TV e com um software específico e alguma perícia, et voilá, tinha a Sport TV descodificada... 
No início dos anos 00, a minha irmã, já adulta, percebeu que o Porto era a minha felicidade e começou a levar-me com regularidade às Antas, até porque deficientes e acompanhantes não pagavam e a minha mana empurrava-me a cadeira debaixo de sol, chuva, calor ou frio, intempéries que não paravam quem por gosto corria. Linda menina, literalmente! 
Nas saudosas épocas de 2002-03 e 2003-04, fomos a todos os jogos europeus em casa, e aos principais confrontos internos. Na nossa única derrota na Champions que ganhamos, estive duas horas debaixo duma chuva torrencial, mas nem galáticos conseguiram atenuar os meus sonhos. 
Cheguei até a aventurar-me a ir ao Jamor ganhar a Taça. Eu era Feliz... Mesmo! 
Em 2005, surge um plasma enorme e uma box pirata que me trazia o Dragão a uma casa quente que se enchia de pessoas para ver e vibrar comigo a cada jogo, a cada golo, a cada vitória do Porto. 
Começava a era do sofá e do afastar do Estádio do Dragão fisicamente, até porque já era caro comprar bilhete e pagar as cotas, mas ainda ia aos clássicos e estive em grandes vitórias, grandes momentos. 
Veio o sinal digital, o "apagar" da Sport TV, o afastamento das pessoas e o "boom" dos streamings via net. 
Hoje em dia, espero e desespero pela melhor página para ver o Porto num quadradrinho pixelizado, largos segundos de emissão atrasada, com sucessivas paragens que me fazem dar murros no teclado adaptado, ansioso, sozinho, stressado, com o consolo da certeza de que vou poder ver o rescaldo no Porto Canal. 
Um dia, acabará o futebol gentilmente partilhado na Internet e até neste campo voltarei ao passado com o invisível relato na rádio. 
Para lá caminho, como prevejo outras situações adversas e injustas para mim. 
Afastei-me do Dragão, do frio das bancadas laterais, do calor da massa humana portista, dos cânticos das claques, do fumo dos cigarros alheios, dos cachecóis levantados, das cadeiras de rodas em fila que eu próprio integrava, dos insultos às mães dos árbitros e lampiões, do sofrimento dum golo na nossa baliza, do orgasmo vibrante e eufórico a cada Golo do Porto que quase me faziam saltar da cadeira de rodas num momento de auge que não sei descrever. 
Da alegria estampada no meu olhar a cada regresso a casa com mais uma vitória complementada com o bilhete no bolso que juntava numa coleção que parou em setembro de 2011, num jogo para a Liga dos Campeões com o Shaktar. Foi a minha última vez. 

Entre 4 paredes, sozinho, há algo que nunca ninguém me há-de tirar: A forma desalmada, eufórica e ruidosa de berrar "GOOOOOOOOOOOLLOOOOOO DO POOOOOORTO"!!! 

Como há 25, 30 anos até hoje. 

Amo-te Porto! 

Manuel Francisco Costa

6 comentários:

Penta disse...

@ Manuel Costa

espero poder ver-te em breve no nosso teatro de sonhos.

é que não há como a nossa casa ;)

abr@ço
Miguel | Tomo II

Dragus Invictus disse...

Bom dia,

Grande portista, grande ser humano, um Dragão Diferente que não nos é Indiferente.

Este texto coloca-nos nele e faz nos pensar na vida.

Obrigado pela tua participação no nosso blog Manuel.

Abraço

Paulo

Anónimo disse...

Perante isto faltam palavras para dizer com verdade o que se sente... e como entendemos.
Abraço.

Azulibranco disse...

Manuel Costa, um abraço comovido. Grande portista!.

Teófilo disse...

Força Dragão, você é um exemplo de o que é ser PORTO e um exemplo para todos os Portistas. Gostava de um dia o ir buscar e levá-lo a um jogo e para isso vou mandar meus contactos por email quando for contacto-o.
Estes relatos comovem-me e revejo-me neste sentimento que une que é comovente. Uma pergunta deixou de ir ao futebol porque agora paga??se assim for vou-lhe resolver o problema.
Um forte abraço grande Portista!

Anónimo disse...

Boa tarde

Habituei-me a visitar e ler algumas páginas acerca do FCP.
Coisa natural, se pensarmos que é como estar em "casa". Ou seja, o FCP como vértice.
No entanto, e para conhecer este mundo, procurei aqui e ali os adversários.
Dir-se-ia que por influência clubística seria influenciado na análise de valores. Mas, o dia a dia veio a provar o contrário.
Neste mundo da "bluegosfera" (Miguel Tomo II) as GENTES são mais genuínas. São sem dúvida ambiciosas, mas para dentro. Querendo que os seus se orgulhem e afirmem no mundo inteiro. Sabendo porém que não estando sózinhos, o que por si só é essencial, aceitam os desafios e de forma competente, séria e com respeito, confrontam os seus adversários. Sem regabofes ou peneiras.
Serve isto para reafirmar a satisfação de ler a referida "bluegosfera" !!
E só neste mundo virtual, conheceria e daria prova de escritos como este.
E de respostas à altura - Teófilo.
São assim os portistas ?
Acredito que "andem todos lá perto" !
Caro Manuel Costa, ofereço~lhe a minha admiração e respeito.
Saúdo o seu fervor pelo clube Futebol Clube do Porto.
Haverão mais Teófilos - Homens, amigos desconhecidos ?
Acreditemos que sim.
Esta esperança é admirável.
Boa sáude para si.
Que volte ao estádio mais vezes.

Um abraço a todos

Luis Manuel
(Coimbra)